sábado, 17 de setembro de 2011

A Visão Puritana da Santidade (por Dr. Joel R. Beeke)

Imagem cedida por: http://imwjdfiladelfia.com/home/sobre-nos.html


Os Puritanos escreveram muito sobre como viver uma vida santificada. Pouco do que eles pregaram e escreveram contém qualquer coisa única ou nova, comparada com sua herança doutrinária. O que é especial sobre a visão Puritana da santidade é sua plenitude e equilíbrio, em vez da sua forma distinta.
A definição Puritana clássica de santificação é bem conhecida; nós a encontramos no Breve Catecismo de Westminster, perguntas 35 e 36:
"O que é santificação?" Santificação é a obra da livre graça de Deus, pela qual somos renovados em todo o nosso ser, segundo a imagem de Deus, habilitados a morrer cada vez mais para o pecado e a viver para a retidão.
Quais são as bênçãos que nesta vida acompanham a justificação, a adoção e a santificação, ou delas procedem? As bênçãos que nesta vida acompanham a justificação, a adoção e a santificação, ou delas procedem, são: 
·         Certeza do amor de Deus;
·         Paz de consciência;
·         Alegria no Espírito Santo 
·         Aumento de graça;
·         Perseverança até o fim".
Destas duas perguntas é óbvio que santificação na mente Puritana envolve todo o viver Cristão - todo o processo de ser conformado à imagem de Jesus Cristo. É um processo que começa no momento do novo nascimento, e continua durante toda a vida do crente até o seu último suspiro. Os Puritanos queriam ver as pessoas crescendo vigorosamente na certeza do amor de Deus, em uma grande paz de consciência e numa autêntica alegria no Espírito Santo. Eles diziam que o caminho para receber estas bênçãos é através da obra santificadora do Espírito. Eles avisavam seu povo: Se você não buscar a santificação, você não somente desonrará a Deus, mas também empobrecerá sua própria vida espiritual. 
O que realmente eles queriam dizer por santificação? Aqui estão quatro elementos da visão Puritana.
Renovação universal e moral

Primeiro, santificação para os Puritanos é uma obra divina de renovação, envolvendo uma radical mudança de caráter. Ela brota de um coração regenerado, que é algo mais profundo do que qualquer psicanalista ou conselheiro poderia alcançar. Deus opera no coração, e como resultado da mudança de coração, vem um novo caráter. 
A obra de renovação é (usando a linguagem Puritana) universal. Isto significa que ela toca e afeta cada área da vida inteira da pessoa. Paulo nos diz em 1 Timóteo 4:4-5 que tudo é para ser santificado - cada esfera da vida. 
Santidade é uma coisa interna que deve encher nosso coração, o centro de nosso ser, e ela é uma coisa externa que deve transbordar sobre cada detalhe de nossas vidas. 1 Tessalonicenses 5:23 diz, "E o mesmo Deus de paz vos santifique em tudo; e todo o vosso espírito, e alma, e corpo, sejam plenamente conservados irrepreensíveis para a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo". Muitos puritanos pregaram sobre este texto. Santificação é para ser universal.
Mas santificação é também moral, diziam os Puritanos. Por isto eles queriam dizer que ela produz frutos morais. Sobre os mesmos frutos nós lemos em Gálatas 5 - amor, gozo, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, e temperança. Se você perguntasse a um Puritano - o que realmente estes frutos significam quando se combina todos juntos? - ele diria que eles representam o perfil moral do próprio Senhor Jesus Cristo.
Isto é o que o Espírito está fazendo na santificação. Ele está moldando o crente ao perfil de Cristo. Ele está reproduzindo as qualidades de Cristo nas vidas de Seu próprio povo. O povo de Deus é aquele no qual a "natureza de Cristo" (a soma total de tudo que Sua vida humana era) encontra nova, embora imperfeita, expressão. Este é o conceito Puritano de santificação.
Verdadeiro arrependimento
         Segundo, santificação para os Puritanos consistia de arrependimento e retidão - a bilateral atividade de se voltar do pecado para a obediência. Arrependimento, diziam os Puritanos, é voltar-se do pecado, e isto é uma atividade para toda a vida. Nós devemos nos arrepender todos os dias de nossas vidas, e à medida que assim fazemos, devemos também voltar para a retidão.
Arrependimento, eles diziam, é uma obra de fé. Sem o Espírito Santo não há arrependimento. O conceito Puritano de arrependimento vai muito mais profundo do que mero remorso, ou do dizer, "Eu sinto muito". A idéia Puritana de arrepedimento certamente começa com remorso, mas ela vai mais profundo para uma mudança essencial de vida. Arrependimento é um voltar real. É um odiar as coisas que se amava antes, e um amar as coisas que se odiava antes.
Arrependimento envolve mortificação e vivificação, diziam os Puritanos. Por mortificação eles queriam dizer "colocar a espada sobre o pecado"; matar o pecado; colocar o pecado à morte, como o apóstolo diz em Romanos 6. Por vivificação eles queriam dizer tornar-se vivo para justiça, e dar a nós mesmos mais e mais para praticar e exibir o fruto do Espírito.
Uma guerra santa
Terceiro, a santificação Puritana é progressiva, operando através de conflitos. Os Puritanos diziam que o conflito é inescapável na santificação, porque resíduos de pecados habitam no Cristão, para sua grande tristeza. Isto o engaja em uma grande guerra e muitas batalhas. Os pecados internos operam de dentro, diziam os Puritanos, enquanto o mundo exerce a pressão ímpia exteriormente. O diabo, que exerce a função de líder, deseja pegar aquelas pressões externas e usá-las junto com as pressões internas para recuperar o território perdido. Assim, embora uma pessoa conquistada pelo Espírito Santo busque expandir e ganhar o território da santificação universalmente em sua vida, o diabo junto com o mundo e a velha natureza da pessoa, forma uma linha de frente de batalha na alma. Uma guerra santa está sendo travada.

Por isso Bunyan chamou o seu livro de "A Guerra Santa". Santificação envolve conflito comigo mesmo, com minha carne, com o mundo, e com Satanás. Se um Cristão não está batalhando contra o pecado, os Puritanos diziam que essa pessoa deveria se questionar se ela realmente é ou não Cristã.

Um Puritano pintou este retrato. Ele disse que ser um Cristão é andar num caminho estreito e reto. De ambos os lados deste caminho há cercas. Atrás daquelas cercas Satanás tem todos os poderes do mal ao seu dispor. Ele usa seu exército de demônios, e até nossas inconsistências internas, e nossa tendência de cair em precipitação. Ele usa todas aquelas coisas como dardos, e a cada passo que damos na peregrinação espiritual ele atira através e por cima da cerca, mirando nosso pé, nosso coração, nossas mãos, e nossos olhos. Cada passo do caminho é uma batalha.
Aceitando um esforço
Thomas Watson disse que o caminho para o céu é uma "obra suada". Há uma batalha sendo travada, mas a obra da santificação, felizmente, avançará. A santificação não está estagnada. Os Puritanos empregavam as palavras de Paulo em 2 Coríntios 3:18, que afirmam sermos transformados de glória em glória se andamos no Espírito. Assim, o verdadeiro Cristão é um que aceita que haverá conflitos, mas que ao mesmo tempo descansa na verdade que a vitória final é sua. Ele pode perder muitas lutas, mas a guerra será ganha, porque ele está em Cristo. O Espírito Santo o guiará, e ele avançará progressivamente.
Contudo, há um empecilho oculto, diziam os Puritanos, porque o Cristão freqüentemente não é capaz de ver qualquer progresso em si mesmo. Um Puritano disse que uma mulher que espana seu mobiliário pode pensar que ela limpou todo o pó, até que a luz do sol brilhe em seu quarto revelando todo o pó remanescente. Quanto mais o Sol da justiça brilha em nossos corações, embora possamos estar crescendo em santidade (e outros possam ver isto), veremos de modo crescente os motivos de nosso coração.
A questão importante não é - "Posso me ver crescendo mais e mais santo?” mas - "Quando eu olho para trás em minha vida, três ou cinco anos atrás, Cristo significa mais para mim hoje do que então? Eu penso menos de mim mesmo hoje do que então? Cristo está crescendo e eu diminuindo? Estou crescendo na apreciação de Cristo, e em minha auto-depreciação?" Estaé a visão Puritana de auto-exame com respeito à santidade.
Outro modo Puritano de avaliar o progresso na santidade é perguntar como estamos atualmente lutando contra a tentação. Se não estamos lutando contra as forças que pressionam nossa carne, estamos regredindo. Em ordem, portanto, para fazer progresso o crente deve orar ao trono da graça: "Ajude-me ser forte hoje, Senhor. Ajude-me a ser puro hoje. Ajude-me a ser justo hoje". Este é o constante desejo do Cristão que está fazendo progresso na santificação.
O ser interno, privado.

Em quarto lugar, a santificação Puritana é imperfeita, apesar de invencível. Nesta vida ela nunca é completa. Nosso objetivo sempre excederá nosso alcance. Muitas pessoas não entendem os Puritanos neste ponto. Eles pensam que eles eram introspectivos, ou que eles nos levavam a uma escravidão legalista, e até mesmo à uma depressão espiritual. Isto não é verdade.
Os Puritanos certamente tinham um conceito profundo de pecado e de justiça, embora muitos dos seus modernos detratores tenham um terrivelmente pequeno conceito de pecado e justiça. Os Puritanos sentiam a imperfeição da santificação deles, precisamente porque eles tinham o padrão da justiça de Deus diante deles. Eles não se comparavam com o seu próximo, mas com a santa Lei de Deus. Justiça para o Puritano era motivacional no caráter. O que existe dentro de você é importante. O que você diz reflete quem você é por dentro.
Um Puritano disse que um homem é em sua privacidade, o que ele realmente é às vistas de Deus. Eles quereriam nos perguntar: “O que você pensa a respeito? O que motiva você? Você está realmente motivado pelo amor a Deus? Você está motivado pela solidariedade do Samaritano para com os outros, amando-os, fazendo-lhes o bem e se colocando para o benefício e bem-estar espiritual deles?”
Este é o coração de uma justiça Puritana. Com este alto conceito de santidade, eles naturalmente sentiam suas imperfeições. Talvez isto em nenhum lugar seja mais vividamente expresso do que nas perguntas e respostas do Catecismo Maior de Westminster sobre os dez mandamentos. Leia-os se você quiser e note quão precisos eles são, como eles sondam o coração e como eles insistem que você deve amar a Deus e ao seu próximo como a si mesmo.
Quando, portanto, você ler sobre como os Puritanos olhavam com pesar para eles mesmos, e quando você ver em seus diários como eles sofriam com a sua própria indignidade, lembre-se que eles estão se comparando com o perfeito Deus e com Sua santa lei. Eles eram homens e mulheres que verdadeiramente sentiam o gemido de Paulo: "Porque, segundo o homem interior, tenho prazer na lei de Deus....Miserável homem que sou! quem me livrará do corpo desta morte?" Eles sentiam sua necessidade de fugir para Cristo todos os dias para serem lavados novamente. E que está é a origem de toda genuína santidade. Tal santidade é invencível. Ela nunca morrerá, mas um dia será perfeita em e com Cristo para sempre.
Este artigo foi adaptado de uma pregação do Dr. Beeke na Escola de Teologia do Metropolitan Tabernacle em 1998, e impresso pela Sword & Trowel.
Tradução livre: Felipe Sabino de Araújo Neto
Cuiabá-MT, 22 de Setembro de 2003.

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