Imagem cedida por: http://convictosoualienados.blogspot.com/2011/03/forca-da-natureza-ou-ira-de-deus.html |
Qual é a desgraça desse estado em que o homem caiu?
RESPOSTA: Toda a humanidade, por sua queda, perdeu a comunhão com Deus, todos estão sob sua ira e sua maldição e, então, são responsáveis por todas as desgraças da vida, pela própria morte e o sofrimento eterno no inferno.
"E éramos, por natureza, filhos da ira" (Ef 2.3). Adão legou um quinhão infeliz para sua posteridade: pecado e desgraça. Já consideramos a primeira parte, o pecado original. Vamos, agora, considerar a desgraça desse estado. Naquele, consideramos a ofensa da humanidade; neste, vamos considerar o sofrimento da humanidade.
A desgraça resultante do pecado original é dupla:
1. Particularmente
Por esse primeiro pecado hereditário, perdemos a comunhão com Deus. Adão era íntimo de Deus, seu favorito, porém, o pecado nos colocou fora do âmbito desse favor. Quando perdemos a imagem de Deus, perdemos seu relacionamento conosco. Ao banir Adão do paraíso, Deus, de maneira figurada, mostrou como o pecado nos afasta de seu amor e seu favor.
2. Absolutamente
Em quatro aspectos: 1. Sob o poder de Satanás; 2. Herdeiros da ira de Deus; 3. Sujeitos a todas as desgraças desta vida; e 4. Abandonados ao inferno e à condenação eterna.
a. Sob o poder de Satanás
A primeira desgraça é que, pela natureza, estamos "sob o poder de Satanás", que é chamado de "o príncipe da potestade do ar" (Ef 2.2). Antes da queda, o homem era um cidadão livre, agora é um escravo; antes, um rei em seu trono, agora, está em grilhões. A quem o homem está escravizado? Aquele que é seu inimigo. Isso tornava pior o cativeiro de Israel. "Sobre eles dominaram os que os odiavam" (SI 106.41). Pelo pecado somos escravizados a Satanás, inimigo da humanidade, que escreve todas as suas leis com sangue. Os pecadores, antes da conversão, estão sob as ordens de Satanás; como o asno está sob o comando do condutor, assim ele conduz todos que labutam pelo mal. Assim que Satanás tenta, eles obedecem. Como o navio está sob o comando do piloto, que o guia pelos caminhos que quiser, assim é o pecador sob o comando de Satanás: e este sempre conduz o navio para o inferno. O maligno dirige todos os poderes e todas as faculdades do pecador.
i. Satanás dirige o entendimento. Ele cega os homens com ignorância e, depois, dirige-os. Como os filisteus arrancaram os olhos de Sansão e, assim, o amarraram, Satanás pode fazer o que quiser com um homem ignorante, uma vez que ele não enxerga o erro em seu caminho, o mal pode guiá-lo a qualquer pecado. Você pode guiar um cego para onde quiser, pois todo o pecado está fundamentado na ignorância.
ii. Satanás dirige a vontade. Embora ele não possa obrigar, pode, pela tentação, atrair. "Vós sois do diabo, que é vosso pai, e quereis satisfazer-lhe os desejos" (Jo 8.44). Ele toma os corações, e estes, passam a lhe obedecer. "Queimaremos incenso à Rainha dos Céus" (Jr 44.17). Quando o mal instiga um pecador com a tentação, ele irá atropelar e quebrar todas as leis de Deus, de maneira a obedecer Satanás. Onde está, então, o livre-arbítrio, quando Satanás exerce tal poder sobre a vontade? "E quereis satisfazer-lhe os desejos." Não há uma só parte do corpo que não esteja a serviço do mal: a cabeça planeja o pecado, as mãos o executam, os pés correm para executar a tarefa do maligno. Cícero dizia: "A escravidão é odiosa para um espírito nobre". Satanás é o pior tirano. A crueldade de um canibal ou de Nero é nada para ele. Outros tiranos governaram sobre o corpo, ele governa sobre a consciência. Outros tiranos mostraram alguma misericórdia para com seus escravos: ainda que trabalhassem nas galés, eles lhes davam carne, davam-lhes horas de descanso. Satanás é um tirano impiedoso: não dá descanso. Quanto pesar Judas suportou. O diabo não lhe deu nenhum descanso até que traísse Cristo e, depois, encharcasse as mãos em seu próprio sangue.
APLICAÇÕES
Primeira aplicação: veja nossa desgraça causada pelo pecado original, escravizados a Satanás. Efésios 2.2 diz que Satanás atua absolutamente nos filhos da desobediência. Que triste praga é para um pecador estar a serviço do mal. Exatamente como um escravo, se os senhores mandam que cave nas minas, quebre pedras nas pedreiras ou puxe os remos, ele tem de obedecer, não ousa recusar. Se o diabo manda que um homem minta ou roube, ele não se recusa e, o que é pior, voluntariamente obedece a esse tirano. Outros escravos são forçados contra sua vontade: "os filhos de Israel gemiam sob a servidão" (Ex 2.23). Os pecadores, porém, estão dispostos a serem escravos, não escolhem a liberdade, mas beijam seus grilhões.
Segunda aplicação: trabalhemos para sair dessa condição deplorável na qual o pecado nos afunda, saindo debaixo do poder de Satanás. Se qualquer um de seus filhos fosse feito escravo, você daria grandes somas de dinheiro para resgatar sua liberdade. Quando, então, suas almas estão escravizadas, não devemos lutar para libertá-las? Promova o evangelho. O evangelho proclama alegria para os cativos. O pecado prende os homens, porém o evangelho os liberta. A pregação de Paulo era "para lhes abrires os olhos e os converteres das trevas para a luz e da potestade de Satanás para Deus" (At 26.18). A estrela do evangelho guia a Cristo e, se tiverem Cristo, então serão livres, embora não da existência do pecado, mas da tirania de Satanás. "Se, pois, o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres" (Jo 8.36). Vocês desejam ser reis para reinarem no céu e vão deixar que Satanás reine em vocês? Não pensem em ser reis quando morrerem e escravos enquanto viverem. A coroa de glória é dos vencedores, não dos cativos. Então, saia da jurisdição de Satanás, deixe que seus grilhões de pecado sejam eliminados pelo arrependimento.
b. Herdeiros da ira de Deus
"Éramos por natureza filhos da ira." A explanação que Tertuliano faz dessa passagem está errada, pois ele entende a expressão "filhos da ira" de maneira subjetiva, ou seja, sujeitos à ira e à cólera, transgressores frequentes na irascível faculdade de um espírito irado. Por "filhos da ira", o apóstolo, passivamente, quer dizer herdeiros da ira, expostos à cólera de Deus. O Senhor, no passado, foi um amigo, porém, o pecado quebrou os laços de amizade. Agora, o sorriso de Deus se transformou numa carranca. Julgados no tribunal, fomos feitos filhos da ira. "Quem conhece o poder da tua ira?" (SI 90.11). "Como o bramido do leão, assim é a indignação do rei" (Pv 19.12). Como o coração de Hamã não deve ter tremido, quando o rei, enfurecido, levantou-se durante o banquete (Et 7.7).
A ira de Deus, todavia, é infinita, outras iras são somente fagulhas: em Deus, a ira não é passional, como em nós; é, antes, uma ação da santa vontade de Deus, pela qual ele execra o pecado e decreta a sua punição. Essa ira é muito triste e é ela que acirra a aflição desta vida, como quando vem a doença, atendendo à cólera de Deus, e a consciência entra em agonia. A mistura do fogo com a saraiva deixa a situação mais terrível (Êx 9.24). Portanto, a mistura da ira de Deus com a aflição produz algo torturante: é um cravo a mais no jugo. A ira de Deus, mesmo só ameaçadora (como o aguaceiro suspenso nas nuvens) fazia as orelhas de Eli tinirem; o que dizer, então, de quando a ira é efetuada? É terrível quando o rei avalia e censura um traidor, mas, é muito mais terrível quando ele o manda para o cavalete ou para ser moído na roda. "Quem conhece o poder da ira de Deus?"
Enquanto formos filhos da ira não podemos fazer nada com as promessas, elas são como a árvore da vida, produzindo muitos tipos de fruto, mas da qual não temos o direito de tirar nem uma só folha. "Filhos da ira" (Ef 2.3), "estranhos às alianças da promessa" (Ef 2.12). As promessas são como uma fonte selada. Enquanto estivermos no estado natural, não vemos nada a não ser a espada flamejante, como diz o apóstolo: "Pelo contrário, certa expectação horrível de juízo e fogo vingador" (Hb 10.27). Enquanto formos filhos da ira, estamos todos "debaixo da maldição" (Gl 3.10). Como o pecador pode comer e beber estando em tal condição? É como Dâmocles, no banquete, que ao sentar para a refeição principal tinha uma espada sobre sua cabeça, pendurada somente por um fio, por isso não podia comer. Assim é a espada da ira e da maldição de Deus, suspensa a todo o tempo sobre o pecador. Lemos sobre um rolo voador, cheio de maldições (Zc 5.3). Um rolo com maldições vai contra cada pessoa que vive e morre em pecado. A maldição de Deus arruina tudo por onde passa. Há uma maldição sobre o nome do pecador, uma maldição sobre sua alma, uma maldição sobre seu estado e sobre sua posteridade, uma maldição sobre a lei. É muito triste se tudo o que o homem comer se transformar em veneno; assim, o pecador come e bebe a própria condenação à mesa de Deus. É assim antes da conversão. Como o amor de Deus transforma qualquer coisa amarga em doce, do mesmo modo a maldição de Deus transforma tudo o que for doce em amargo.
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